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segunda-feira, 11 de julho de 2011

Economia e pão para todos

A solidariedade ajuda-nos a ver o outro como um nosso semelhante

Um dos princípios basilares da Doutrina Social da Igreja é o da destinação universal dos bens criados. Em linguagem religiosa significa que Deus criou o universo para o bem dos seres humanos, de todos eles. Esse princípio é a explicitação da dignidade inviolável da pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus A pessoa não pode ser instrumentalizada para nenhum fim. A ordem social deve ser tal que cada pessoa humana tenha reconhecida, na prática, sua dignidade e possa desenvolver-se até chegar à plenitude de sua humanidade.

A pessoa deve ser, por isso, ela mesma, o sujeito do processo de seu desenvolvimento e não pode ser substituída por outra instância no que diz respeito às decisões sobre si e sobre seu destino. É que não há realização da pessoa humana sem a liberdade. Liberdade é, antes de tudo, o poder de decidir sobre si e sobre a própria vida. O fato de a humanidade ser formada por uma multidão de pessoas coloca, entretanto, um limite para a liberdade de um indivíduo: o “outro” que ele mesmo.

O outro é pessoa. Daí surgiram duas regras fundamentais de comportamento:

a) Não faças ao outro o que não queres que o outro te faça;

b) Deves fazer ao outro tudo o que desejas que o outro te faça.

Kant, na mesma linha, sentenciou: “Age apenas segundo uma máxima tal que possas querer que se torne uma lei universal”.

Na revelação do Antigo Testamento assim aparece esta regra de ouro: “Ama o próximo como a ti mesmo”. O outro, portanto, não é, em primeiro lugar, um obstáculo para a minha liberdade, é seu destino. Ele põe, sim, um limite a meu desejo de onipotência, lembra-me que não sou a totalidade do real. Mas o outro é, sobretudo, apelo a que eu cuide nele da humanidade da qual também ele participa. Jesus deu como lei suprema para Seus discípulos um mandamento novo: “Amai-vos uns aos outros”.

Se todos cuidassem de todos, o mundo seria, sem dúvida, o paraíso: um lugar de imensa paz. Precisamente porque este mundo pode ser o paraíso é que temos do paraíso saudades. Jesus não só ensinou, Ele fez. Por isso pôde acrescentar: “Como eu vos amei”.

Do outro não posso tirar a vida, mesmo que ainda esteja em seu mais remoto começo - embrião ou feto -, mas ao outro posso e devo doar a vida. Não posso matar o outro, mas posso morrer por ele. Essa é a grande lição do Cristianismo, da qual nós estamos longe de pôr em prática. Uma vez que a vida depende do pão de cada dia, Jesus ensinou-nos a rezar: “O pão nosso de cada dia nos dai hoje”.

Tira-se a vida não só quando se mata em ação direta - como se faz nos abortamentos e similares -, mas também quando se rouba o pão do irmão. Também quando não se sabe repartir. Esse problema é o problema maior da humanidade. O Evangelho não nos deixa mentir.

Escute, leitor, o que ensinou Jesus: “Vinde, benditos de meu Pai, recebei por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Porque tive fome e me destes de comer...” E disse também: “apartai-vos de mim malditos para o fogo eterno preparado para o diabo e seus anjos. Porque tive fome e não me deste de comer...” (cf Mt 25,31-46).

Ora, se a vida econômica da sociedade se organiza de tal forma que os bens – “pão” significa todos os bens necessários para uma vida digna – deste mundo se concentram nas mãos de uma parte da humanidade em detrimento da outra, estamos diante de uma situação de injustiça, embutida na ordem econômica.

Ora, o momento em que vivemos está a nos dizer da necessidade de ordem econômica mais justa. É curioso e sintomático que, para enfrentar a presente crise, o presidente Bush reúna os oito grandes e que, subseqüentemente, queira reunir os vinte emergentes. E as outras nações? Elas não têm nada a dizer da atual (des)ordem econômica internacional?

Em 2004 o Compêndio da Doutrina Social da Igreja advertia: “Nos organismos internacionais devem ser equitativamente representados os interesses da grande família humana; é necessário que estas instituições, ao avaliarem as conseqüências das suas decisões, tenham em devida conta aqueles povos e países que têm escasso peso no mercado internacional, mas em si concentram as necessidades mais graves e dolorosas, e necessitam de maior apoio para o seu desenvolvimento” (n. 371).

João Paulo II ensinava em uma de suas encíclicas sociais: “A solidariedade ajuda-nos a ver o outro — pessoa, povo ou nação — não como um instrumento qualquer, do qual se explora, a baixo preço, a capacidade de trabalho e a resistência física, para o abandonar quando já não serve; mas sim, como um nosso semelhante, um auxílio (cf. Gén 2, 18. 20), que deverá se tornar participante, como nós, no banquete da vida, para o qual todos os homens são igualmente convidados por Deus. Donde a importância de despertar a consciência religiosa dos homens e dos povos”.

Na mesa da humanidade devem poder se assentar todos os seres humanos.

D. Eduardo Benes

(Fonte – Canção Nova)

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